quinta-feira, 23 de julho de 2009

O Tempo

Oração ao tempo

“...Compositor de destinos
Tambor de todos os ritmos
Tempo tempo tempo tempo
Entro num acordo contigo
Tempo tempo tempo tempo
...E quando eu tiver saído
Para fora do teu círculo
Tempo tempo tempo tempo
Não serei nem terás sido
Tempo tempo tempo tempo

...Ainda assim acredito
Ser possível reunirmo-nos
Tempo tempo tempo tempo
Num outro nível de vínculo
Tempo tempo tempo tempo”


Essa letra de Caetano Veloso é muito pertinente!!!

Há pouco mais de um mês fui assistir uma peça de teatro que falava sobre o tempo; dos dias, das horas, além da pedra durante todo o processo histórico.
O nome da peça é “O calendário de pedra” de Denise Stoklos . A interpretação dela me comoveu profundamente e me fez refletir sobre o assunto, assim como me inspirou, de certa forma, a escrever essas linhas.

No decorrer da peça, através da interpretação da atriz percebemos o quanto de nós está naquela personagem; o como vivemos daquela forma e nem nos damos conta disso, o quanto nos deixamos envolver por coisas que são tão pouco importantes para o nosso processo de individuação (situação em que nos tornamos nós mesmos, inteiros, indivisíveis e distintos dos demais ou da psicologia coletiva mesmo tendo relação com ela) e toda a nossa vivência.

Durante as várias falas da atriz (a peça é um monólogo), pensava: como somos tolos, vivemos em função do tempo e dos outros!! Afinal, era isso mesmo que o espetáculo queria mostrar e provocar!!

Pensei: Nós não aproveitamos o que de fato o tempo nos dá, que na verdade é a possibilidade de viver, apenas viver, sentir, e não só sobreviver. Estar aqui e fazer coisas que sempre nos leva a “posições” de todas as espécies é viver como escravos do tempo da pior maneira possível. Ainda a tempo de refletir e fazer diferente, fazer a diferença. Podemos viver o tempo de maneira mais gostosa, mais real e menos voltado pelos valores impostos.

Em um dado momento da peça Stoklos cita o filósofo Sócrates: “Só sei que nada sei”. E também uma frase sobre a morte: “A morte é a única certeza que temos, só que não sabemos quando acontecerá”. Essas duas frases me fizeram pensar sobre as verdades. Será que posso pensar que ao compreender essas duas frases poderei viver mais feliz, em busca de algo que não sei e nem preciso saber o que é?!

Ficou evidente no espetáculo a necessidade que temos de aprender, e absorver o quanto antes tudo aquilo que se faz importante aos olhos da sociedade, aos olhos do sistema em que vivemos. Assim, por um lado a informação nos torna escravos, e no mundo em que vivemos, cada vez mais, nos vendem a idéia de que precisamos dela, por outro o que necessitamos de fato é de formação humana, para inclusive entender como desperdiçamos o tempo precioso.... Como lembra a letra de Lenine tocada em certa parte da peça: “... O tempo é tão raro... Será que temos esse tempo todo pra perder?”.

O personagem interpretado por Stoklos não olhava para si profundamente, senti falta de uma introspecção maior e isso me deixou com uma sensação de tristeza e frustração ao mesmo tempo, pois sei que nos dias atuais as pessoas realmente se olham cada vez menos. Nesse sentido, a personagem e as reflexões de Stoklos são reais, e por isso incomodam tanto. O que mais importa hoje é sempre o que temos e não o que somos!


Bye

domingo, 12 de julho de 2009

Resistência


Bom, a minha ausência nesse espaço se deu por pura falta de inspiração...

Decidi colocar aqui uma citação do livro Resistência - A história de uma mulher que desafiou Hitler que estou lendo e achando bárbaro... Logo no prefácio (de Marina Colasanti) tem algo muito interessante sobre a condição da "Mulher", gostaria de compartilhar:

"No imediato pós-guerra, uma peça fez sucesso na Itália. Chamava-se Le donne hanno perduto la guerra. Eu não tinha nem dez anos, mas lembro claramente da intensidade com que minha mãe e os adultos a comentavam, e o título gravou-se em mim. As mulheres sempre perdem a guerra. Não a querem, mas a perdem. Perdem quando estão no caminho dos exércitos e se tornam botim. Perdem quando batalham em silêncio nas cidades esvaziadas dos seus homens, para manter sólida a retaguarda e conservar a ordem do país. Perdem quando recebem seus homens num caixão ou quando eles voltam com o equilíbrio despedaçado. Perdem quando se apaixonam pelo inimigo e quando o inimigo se apaixona por elas".

Gostaria de pensar a perda que a mulher tem... O que seria essa perda? Somente de seu homem? Por que perdem a guerra em silêncio quando batalham nas cidades esvaziadas dos seus homens? Parece-me uma visão muito reducionista da mulher olhando num primeiro momento, mas acredito que não foi isso o que a Colasanti quis passar, porém foi isso que senti ao ler esse trecho, por que será? A perda na guerra é eminente com certeza, não só a mulher perde, mas todos nós. A guerra é a coisa mais estúpida que pode existir na terra... Luta pelo poder dominante que fere e mata!!

Outro dia escrevi algo muito pessoal e informal ao responder um e-mail sobre um artigo de Frei Betto (A difícil arte de ser mulher) no qual coloquei uma coisa que fez muito sentido pra mim naquele momento e ao ler esse trecho de Colasanti, lembrei-me imediatamente:

É lamentável olhar para as pessoas e perceber que cada vez mais caminhamos para um mundo onde só o que importa são questões tão pouco ou nada reflexivas (subjetivas)... A mulher não ocupa um lugar de igualdade, e a igualdade que ela busca não é a mesma que a sociedade permite, se é que permite... As coisas são sempre muito veladas e isso me causa um desconforto imenso, mas as questões de gênero podem mudar, afinal acredito na dialética. Quem sabe a cultura (valores) se transforme e tenhamos uma realidade bem diferente algum dia?


O livro fala sobre a história de uma mulher que desafiou Hitler, a historiadora de artes Agnès Humbert, que não se deixou abater pela opressão. Ela relata seus momentos desde a tomada de Paris até o momento no qual ela é liberta... Fascinante... Vale a pena ler!!! Assim como ela, tantos outros nomes foram importantes e de certa forma decisivos nessa parte da história mundial, assim como na nossa história, pois o Brasil também vivia uma época difícil com a ditadura Vargas e logo a censura, onde vários profissionais das mais variadas áreas de atuação sofreram algum tipo de "violência" e/ou foram exilados. Poderíamos simplesmente falar sobre outros pontos fortes da mulher num momento como esse de extrema fragilidade humana, ela é forte e sagás, luta como ninguém para defender seus entes, a mulher sofre, porém não desiste, sonha, tem esperança e isso me faz lembrar outro trecho que li, esse já de Agnès (Humbert, p. 82):

"Fui interrogada pelo promotor, que alegou querer me conhecer antes do julgamento. Fez grandes elogios às mulheres francesas e me disse que, se o Exército francês contasse com mulheres em vez de homens, os alemães jamais teriam entrado em Paris. Minhas lembranças são tão claras que posso escrevê-las seguindo uma ordem rigorosa. Praticamente cada uma dessas páginas está ilustrada com uma imagem bárbara. Muitas mulheres, milhares e milhares de mulheres, viram as imagens que vou descrever".

Contudo o que quero é demonstrar a minha indignação por termos tão poucas mulheres (pessoas) com a força e a determinação dessa mulher que foi a Agnès Humbert, que não desistiu um só minuto de lutar por aquilo em que acreditava, acima de tudo pela liberdade! Porém, fica aqui um exemplo de vida, um exemplo de coragem e acima de tudo um exemplo de mulher!!!!






Para quem quiser:

Resistência: A história de uma mulher que desafiou Hitler; Agnès Humbert; Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.

O Prefácio (A silenciosa força das mulheres) é de Marina Colasanti

Boa leitura,
Bye